30.12.20
frio que vem da rua
Nuno Casimiro
Estou a pensar em ir beber cerveja
para outro lado,
onde não conheça qualquer lager
nem persista a azia do dia seguinte.
Penso em acabar com tudo,
na verdade,
a cada conversa enraizada
num par de horas
envoltas na inexplicável bruteza
duma língua torcida.
Só a soberba de ouvinte desvirtua
a destreza da consciência
e um purismo qualquer
consola a ingenuidade reflectida
no pouco que se vive – o desapego
é tão libérrimo quando convém...
Estou a pensar em ir beber cerveja
para outro lado,
onde não conheça o vazar dos rios
nem me confunda com o chão que piso.
Penso em acabar com tudo,
na verdade,
a cada lua que se enche
no período mais fértil
da desatenção,
carregada de nostalgia
que range os dentes mais distantes.
Talvez mais lá à frente, de pescoço esticado,
seja capaz de ouvir os ritmos mais contagiantes
e permita que o corpo dance
a leveza de não questionar o embaraço –
ai, como sinto o frio que vem da rua...