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À Beira da Lua

À Beira da Lua

13.03.21

pontas dos dedos


Nuno Casimiro

sustenho a respiração
acompanho
o refluxo das
ideias
que se imortalizam
no comprimento
de um braço dormente
            denunciado
                    
                    encerra-se
                           a noite

o olhar culmina no
desespero
da fantasia vã
embalo numa balada
que não me larga
desde as três da
tarde
treme o dente
             a boca
as pontas dos
              dedos
       e dos teus
           cabelos

                      encerra-se
                         a palavra


acordo com a promessa de
barriga cheia
vai feder a enchidos
até ao fim de tarde
além fronteiras
além dizeres
pressentidos
enrolo circunstâncias
expilo memórias de
cheiros
coloco o café em lume
alto
e prossigo um pouco de
vida

                          o assombro
                              vem encerrar
                                         a língua

11.03.21

miriâmetro


Nuno Casimiro

Não consigo desprender da fantasia
a profundidade do teu
                                       abraço

Corrupio em largura de vortilhão
sem membros nem balandrau

Convido a inquietude a sentar
à beira da precipitação das chuvas
mas nenhum dia
                              faz um mês

Assomo as ruas largas do teu calor
virando a cara ao relento

Disponho os novos desembaraços
e amanho o peixe que sobra
mas nenhum dia
                              faz um mês

Seguro uma estrela nas mãos
enrolando os sabores de preia-mar

Admito-me enquanto se entorna o dia
ao longo do miriâmetro do teu
                                                     abraço

11.03.21

ritmo lento das coisas


Nuno Casimiro

Ilustro um desdizer
mal a noite abre
o dia.
Chocam as metáforas
outrora pontificadas
no estudo apressado
das coisas.

Desmancho a língua
que me soletra
de relance
sem questionar a dor
que se esconde entre as
costelas frouxas.
Cessa o movimento:
não há contágio sobre as coisas
belas.
À cabeça que se põe
lá fora, com efeito
e circunstância,
repudia-se um dia que desfaz
as estações do
tempo.
Mal abro os olhos
à medida que o café se faz.

Talvez ainda busque a pureza
de um chilrear que chega
de qualquer
canto. Canto que arrasa
            uma forma de estar.

Pela noite adentro
calam-se vozes distantes
que interrompem a ordem
das marés baixas – bem espreito
acima dos silêncios
mas nenhum reflexo catapulta
um almejar mais
fortuito.

Pela janela ilustro um desdizer
enquanto a inquietação esbarra
no ritmo lento
das coisas.

07.03.21

copo alto


Nuno Casimiro

          calafrio em timbre
(procuro o brilho
dos dias)
aceno para longe
acendo a chama a meros
passos trocados
ouvem-se mais
e
mais arrastões
reboliços transviados

          hesitações primaveris
arranco flores
antes do tempo
persistem num copo
alto,
à mercê da tua altura

(continua o brilho
dos dias)
olho-me sem rosto
vozes solícitas brindam
aos céus
desvanece o calor
na pele    na testa

          algo chega por detrás
do que se espera
uma nova verdade: desenterrada
ou fermentada na
despedida

a sensação engasga

falta
firmamento na algibeira
aumenta o som de fundo
procuro a sombra
dos dias
nem noite nem luar
nem uivo
nem
admite-se convicção
entre cervejas

          improviso na reacção
mal me quer um estímulo
uma flor azul
um instinto em tons
de lilás
chega um impasse em forma
de nuvem
que se assombra
e
desvenda o brilho
dos dias
bem me quer um soslaio
um arrepio um
pressentimento
entre parêntesis

03.03.21

sol despido


Nuno Casimiro

          chega com o ar
trancado
a voracidade
desalinhada

entre as acácias
levanta-se um breve
rumorejo
ouve-se a água
tem pressa em espalhar
candor

nos olhos intumescidos
vê-se o futuro
da palavra
andamos mais um pouco
reencontro com o sol
despido

grrri grrri
salta a consciência
para a outra
margem
a voz soluça no seu
encalço
abafada na pureza
que vai galopando
entre as
correntes

há um retorno ao
silêncio
sílabas omissas
calor na boca
a perna adormece
treme
em reflexo

          repete-se o rumor
que se instalou
nos relevos
flores perfumam a
assumpção

um copo de vinho
um dia sem nuvem
fiquemos por aqui