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À Beira da Lua

À Beira da Lua

25.05.21

em passo pouco urgente


Nuno Casimiro

quarenta e 7 pormenores em esquina
vãos de escada sem auxílio

não digo nada
nem é urgente dizer

encosto-me ao sol
onde ninguém espreita
por baixo das onomatopeias

tanta gente a deslizar
atrás das cortinas
de onde sopra o primeiro vento

tanto pormenor em esquina
balançam sórdidas as benesses

disseco um chilreal
em passo pouco urgente

haja conforto num soslaio
para lá das manhãs que se perdem
quase de propósito

ganho voz sem medir distâncias
ultrapasso desatinos
porquanto se façam versos

algibeira
vinte e 5 detalhes
grito que se esconde
faça-se noite
depressa

haja guerra para lá da desatenção
por enquanto deixo-me estar

não digo nada
nunca é urgente dizer

16.05.21

passos em volta


Nuno Casimiro

Quem sabe se não é desta
que possuo toda a loucura.
Anda aqui isto
que me desassossega –
eu que da cintura para cima
sou lúgubre.

Reacende-se a vela
que dá espaço à noite.
Cruzo as coisas que nunca saberei
e alcanço um paradoxo
que recita sons de fundo.
Sigo um desvaio eterno
em constante reestruturação.
As pernas escondem o peito
que embroma volume
de não saber para que serve.
Mas arroto uma existência
iterável e simbionte.

Quem sabe se não é desta
que possuo toda a loucura.
Anda aqui esta sensação
que me amedronta –
eu que da cintura para baixo
sou tremor.

Ainda me deito em pose de morrer
sem recriar os passos em volta
do mesmo assobio que se intromete
entre os ventos fortes.
Em cada esquina calcorreio
um verbo diferente
jamais pertencente à ponta de língua
que ferra o desatino.

Quem sabe se não é agora
que possuo toda a loucura.
Anda aqui esta comichão
que me assola –
eu que da janela para fora
sou reflexo.

Falta miolo à visão turva.
Medito sobre as horas mortas
sem prestar contas à coerência
que ninguém lê.
Arrebito como um cão
que desespera pela sua vez
de ser ouvido.
Constituo uma frase
enquanto busco uma palavra certa
na esperança de sorver algo
que se diz às escondidas,
em pleno mistério.

Quem sabe se não é agora
que possuo toda a loucura.
Anda aqui esta dormência
que me aligeira –
eu que fora de horas
sou sombra.

Vou ter pulmão
para além da data limite.
Abarbo uma bocada de sol
e com esta nova verdade
poderei aceitar o valor dos espaços.
Logo que tenha brio
tatuarei o tempo demorado,
tanto quanto souber dizer.
Se calhar já ferve a casa
que me pertence.
Mas sim, quem sabe se não é desta
que possuo toda a loucura.

15.05.21

equação da ternura


Nuno Casimiro

de soslaio arredo pé
com direito a encomenda
prevejo a loucura pardacenta
conjugada milenariamente com o sopé

será desta que absorvo ruína sucinta?
tenho dois tostões contados
facilmente decoro a cerveja distraída
de caras com dias fecundados

já apita a panela robusta em pressão
porquanto se moveu o ímpeto da frescura
sem tão pouco acostumar a face à sofreguidão
sem ritmo para a equação da ternura

rolam as gentes sem medo nem zelo
certamente sabem da cicatrização
de quando em vez curvo lentidão
e engendro uma entorse de tornozelo

mergulho a pique sem conhecer fundo
nem questão flutua em consonância
em verborreia ziguezagueio e perscruto
toda a técnica da floreada dissonância

12.05.21

cintura em rutura


Nuno Casimiro

sem maré reversa
a cabeça desfaz-se sem reserva
tão pouco se questiona a pressa
de partir o desatino em mil bocados
trocados.

catalisador é o percalço
que aguça o passo em falso
tão pouco se constrói em aço
uma eternidade que assente
entre
idas e retornos sem medida
tal possa ser a fobia tremida
de resumir a estreita saída
em saudade que me encerra num bolso
a vulso.

despisto sombras enquanto esquenta
e faço de conta com pêlo na venta
que reajusto a voz que bem tenta
dissipar a vertigem da cintura
em rutura.

11.05.21

rasgo de sol


Nuno Casimiro

um rasgo de sol
desencadeia um ronronar
abaixo do diafragma
a relva esporeia a pele amenizada
    sei das horas
sensação de estômago despejado
além disso fomento uma
débil precipitação
acerca de um ósculo
    sei dos erários
evoco um desatino
o carro nem pega
falta emprestar amor
à rotina de bolso
    sei dos fluxos
às vezes durmo bem
sem regurgitar passos
sem medida inventada
à luz do tempo que se esgueira
    sei das sombras
um tremor umbrífero espreita
pelas lâminas afiadas do estore
nas mãos encerro o mundo
nas distopias indago a voz

    mas
    sei das coisas mais belas
como a pele que se esquenta
    e se abrilhanta ao som do verão
ou uma pétala que se esmera
    e irrompe o olhar abstrato
e ainda a brisa que te alenta
    nas manhãs mais demoradas

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