29.10.21
vem aí chuva
Nuno Casimiro
vem aí chuva
sou pequeno como a primeira gota
microscópica que anuncia a dor de joelho
deve ser de persistir
em andar atrá do tempo
que se imaginou em cada contracurva
na paisagem que sempre foge
pela janela de um peito vazio
os dias tropeçam na noite
faz-se silêncio na iminência
de uma sílaba mais cerrada
corta o vento pelo caminho
que nunca se escolhe e
encolhe a língua sem dizer ao que vem
falaciosamente cumprindo a indiferença
que cresce apertada
vem aí chuva
sou um pequeno nada
como um dia taciturno de inverno
desaparece o brilho
numa troca de cadeiras
ninguém deixa esquentar o desatino
de viver sem sobressalto que exaspera
uma palpitação inesperada
inda vou a tempo
comprei o bilhete das treze
para longe da vista desarmada
apalpo os bolsos e julgo ter condições
de trespassar o nevoeiro vespertino
não encontro nenhum medo
nem hesitação que me faça coçar
o pesadelo que me insinua
têm dito que vem aí chuva
talvez esperasse a maior precipitação
para terminar o pesamento