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À Beira da Lua

À Beira da Lua

22.02.23

lugar comum


Nuno Casimiro

Em cada desatenção
        uma primavera brota

De jeito enturpecido
lá se vai escapando o tempo
no fraquejo de quem espera

Fogem-me as flores das mãos
esvaziando o que de si mesmo
jamais uma palavra encheu

Vagamente um assobio ressalta
uma memória hesitante
e um lugar comum estreita-se

Em cada palpitação
        uma primavera cede

Rasuro uma intenção
no desdém de uma manhã
trocando as voltas à voz

Passo um pano no pó que se espalha
entre os livros de que ninguém fala
e os dias adensam uma forma de falar

Enrolo um alívio
e fumo-o apressadamente –
amanhã saberei melhor

Em cada suspiro
        uma primavera espreita

19.02.23

breve


Nuno Casimiro

                    Volto
de onde parti
a cada quarteirão que não conheço.
Rasga a chuva tímida
                                 que cai
um sol ansioso por dizer de si,
tal como um corpo cansado
de ter fome sem saber onde comer.

São só            re
                             dun
                               dân
                           ci
                    as
e o pensamento _________
de súbito.
Sinto-me eternamente à espera
que se rasguem os céus
com toda a intenção
de haver mais brilho.

     Ai, quem me dera ser breve!

 

19.02.23

vertigem comum dos dias


Nuno Casimiro

Flores e cores
   e coisas leves
      coisas semi breves
   e amor a meias
      amor de mil luas cheias

Sei do abraço que ampara
e da voz que acalma

Mas tudo se verte
na vertigem comum dos dias

O olhar altera-se
e a voz agrava um momento
sem comunhão de ritmo
sem pestanejar um peso
destinado ao acaso

Beijos e amassos
   e coisas bonitas
      coisas que se dizem
   e bafos matinais
      desejo de amor

Passa rápido um instante inteiro
completo ciclo de se aprender a estar

E tudo se recompõe
na ordem irregular dos dias

Encho a algibeira de possibilidades
que não passam disso
e a voz vai-se pondo fina e mais ligeira
sem cor e desbaratando
comprometida com o esquecimento

19.02.23

promessa de sol


Nuno Casimiro

Roda o espírito assombrado
ansiedade vil que esfria os sentidos.

Está-se bem entre estranhos
sem piar
         nem imaginar
                  onde podia estar.

Julgo estar onde devo
cruzado-me a cada esquina
com qualquer promessa de sol
capaz de beliscar quem não sou.

Roda tudo à volta —
nenhuma bússola se orienta
neste frenesim
                        de me pensar
                                    sozinho.