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À Beira da Lua

À Beira da Lua

24.11.23

um movimento que acontece


Nuno Casimiro

Tenho sentido coisas: por vezes um
formigueiro debaixo da
língua – detenho-me na busca por uma
definição mais pomposa rítmica talvez
sobre uma simplicidade: por vezes um
músculo treme em reflexo – resvala na
porta um eco sobre a noite
possivelmente um mistério que não mais
se contém: por outras vezes um som
agudo testa a paciência do ouvido
cilindra para lá das janelas um movimento
outonal quiçá retrospectivo sobre as
rotinas. Vou sentindo certas coisas ou
estímulos até mesmo em forma
de sabor: ainda no outro dia foi um
gelado em flor – mesmo debaixo de chuva
posso acontecer certamente num trago
de tiramisú: algures num desses verões
que mal terminam foi uma praia
desenhada por alguém – ainda que
não haja litoral suficiente com certeza
para tampouco hastear bandeira
ou criar país.

No parêntesis de um prelúdio onde
pouco se alcançou preencho esse espaço
com uma ânsia inconsequente (vou tendo
sede de coisas a cada ímpeto que se
quebra porém sossega saber de cor
uma poesia mastigada) e demoradamente
assento tijolo numa forma espaçosa de
me sentir longe

Invertidamente já procuro o sol de
inverno: respeito a pausa para pensar ao
que os dedos inebriados vão dando sinal
perante a luz da noite que se vai movimen
tando em ciclos – por vezes olho até onde
alcanço para ver onde está a lua
inadvertidamente penso num beijo que
fica sempre por dar: com um sopro
quente e a mão assertiva desembacio
os dias passados e prendo um movimento
que acontece – há uns tempos destoavam
tons amarelo-melancólicos contudo
mais cores ganham vida eventualmente.

Expectantemente sorrio
       a cada véspera de se desintegrar
             outro sufoco para além de mim

21.11.23

bonança do teu cheiro


Nuno Casimiro

Na presença da ausência
dum qualquer espírito estreito que
rodeia calores roucos em
sintonia com milhares de palavras
que possa trocar contigo ou bem alto
para uma ondulação pouco enrolada –
          Desvinculo-me duma coisa
          mais pura ou certa e
          assento estes dizeres
          até onde posso ser

Desenrola-se um dia
que começa chuvoso
arregaço as mangas
arregalo os olhos
arremesso o que não sei
expilo fumo p'lo canto da boca
sorvo o café avidamente
antes que esfrie –
          Desbrava outra sequência
          de coisas embaraçosamente ditas
          à medida que se apressa o breu
          no final de um dia amorfo

Persiste ténue a inacabada
vontade de reaprender o trote
que espreme e desprende as
convicções que nos ocupam

A chuva prossegue miúda amiúde
mas sempre surge um rasgo expectante
de um prelúdio de sol enquanto
pernoito no quente do teu peito
e na bonança do teu cheiro