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À Beira da Lua

À Beira da Lua

28.02.24

singela tentativa de frescura


Nuno Casimiro

contemplação
day by day by day by day
a seguir a domingo é quase sexta
fôlego renovado barriga limpa
sentado num degrau
ainda agarro um raio de sol
penso montanha cruzo calçada
subo elevador paisagem calada
seca compostagem de desânimos
põe na conta pois não tenho vontades
para suprir outro dia sem ego verdejante

oportunidades póstumas
de dizer como se corta queijo
posto isto tenho saudades
bem sabia deixar passar o dia
lento sabor perdura sensação
calor maresia cascabulho
búzios e pão torrado
poesia à beira rio vozes distantes
parte de uma conclusão indulgente

estrada que se alonga nuvens a rasgar
som que se afunila vento a soprar
saber estar onde se pertence
pedaço de terra limoeiro invasivo
cheiro a café fumo expansivo
perto ser longe longe ser evasivo
sabor a primavera desejo primitivo
vem-te daí moço não vale melindrar
conquilha miúda roda bem o calcanhar

contemplação
by day by day by
cadência dissimulada o interlúdio
alarme activa deslumbramento
resta o extraordinário a expectativa
ainda não lhe pertenço
não se vê mas colectei gotas de chuva
singela tentativa de frescura
ténue fluidez palavras organizadas
formas despachadas de assentada
lá agarro o raio do sol tentação cruzada

day by day
contemplação

26.02.24

sonho comum


Nuno Casimiro

num canto de qualquer porta
continua a ameaça de chuva #chove
fico sozinho uns minutos pingas
de água esborratam um primeiro
PENSAMENTO [ tela de cinema ]
in-yan 8 mil camadas de vidas
passadas a ferro roupa continua
amarrotada parabéns por mais
um ciclo de coisas por dizer glitter
all over the place que bela POSTA de
vitela não quero mais carne na vida
rum cola segue a vertigem há sempre
um regresso a casa continua a chover
mal se dorme sem ocasião para dançar
sem aura que oscile entre politiquices
aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa
é sempre véspera de mudança cinquenta
anos de liberdade quero votar cunhal aí
vêm sequências de rateres de oposição
diz que não é constitucionalmente
correcto mascar chicla sozinho em casa
porém
contudo
facilmente
cada um torna-se #addicted
à primeira benesse [ consonância em
prosa] bonne chance camaradas
tão belo será SUSPIRAR
pelo sonho comum

19.02.24

amendoeira em flor


Nuno Casimiro

ensopado em getz
sorvo o molho à base de colorau
cebolas, azeite, gilberto e alecrim.
estico a perna assim que
pica a dormência infalível
de barriga cheia. lembro um
rio lento e como sabe bem
comer peixe na casa da mãe.
volto ao molho munido
de pedaços de pão –
não há bordado para sujar
nem pinga que se debruçe sobre
a dourada mal amanhada.

encolhe-se a esplanada vazia
onde páro. qualquer voz me sacode
a atenção sem perscrever a intenção
de estar só. de cigarro em riste, seguro
uma vontade de existir num momento
longo, mas sempre escurece por cima
dos pensamentos mais passageiros.

diametralmente, ofusco um mover de
mão mais astuto e prossigo em perseguir
palavras que me emprestem estrutura
e certeza. mal encontro uma rima
dispersa insisto em desmanchá-la
em ritmo disfarçadamente trauteado.
o paladar vai-se prolongando perante
os ventos que assobiam intempéries.
molho os lábios face à secura ingénua
que vai revelando diferentes aromas
dos ciclos vespertinos dos meus anseios.

tal como um vislumbre
de uma amendoira em flor
ameniza uma saudade,
concluo um dia entre parêntesis
afirmando um passo regulado
pela certeza da memória de um sabor.

(persisto na véspera de celebrar nostalgias,
iminência de cabelos brancos e uma
voz menos aprisionada. a roupa estendida
anseia por ser recolhida na cadência de
um sol que lugubremente se vai soltando.)

10.02.24

morbidez de pensar breve


Nuno Casimiro

Entre despiques assimétricos
lanço umas bafuradas díspares
bafejadas pela lógica do paleio
que se encolhe mal se encara.

Tapo os ouvidos e
restabeleço um sossego
penso para dentro que devia
saber melhor. Salto da cama com
o passo desregulado, julgo o peito
escancarado desprovido de choro.

Tenho um cheiro estancado no nariz
que me lembra insistentemente
um poema corriqueiro
sobre amor longínquo.

Tento pensar numa presença lenta
que deu o seu lugar a um silêncio
esporadicamente metafísico
inolvidavelmente palpável.

Na morbidez de pensar breve
aprisiono uma intenção alongada
e permaneço longe de um interlúdio
entre palmeiras, sopas e sizígias.

Laconicamente,
já ninguém escreve simplicidades
a três quarteirões da baixamar.